Imagens, palavras e impressos são os ingredientes que se materializam em trabalhos cujo método é o feminismo latino-americano. Ao ordenar artisticamente a realidade, o feminismo que eu vivo seleciona imagens, edita palavras, produz e coleciona impressos. A personagem A Mulher do Canto Esquerdo do Quadro, por exemplo, narra acontecimentos e vive ficções quase historiográficas. Para A Mulher, eu crio uma biografia verossímil por meio de uma investigação de indícios existentes no frame no qual ela é apresentada. Posso afirmar seguramente o local em que estava, a data aproximada, o tipo de roupa que vestia quando fez seu gesto frente à câmera. Uma narrativa encarnada é composta por mim, e há nela um duplo objetivo: mostrar a história de uma mulher e ocultar ao máximo que é uma construção, pois o importante é o que é dito, e como é dito. O ocultamento é o ponto principal de tensão com quem vê e lê a minha produção. Percebo que ele promove aproximação ou distanciamento das pessoas “leitoras”: umas agarram o livro e o levam consigo para a vida; outras o rechaçam e o abandonam. Como ao escrever não espacializo a palavra, meu gesto de artista se presentifica na leitura da outra pessoa e não em expografia de página ou de parede. Meu encontro com a palavra é o da incorporação compartilhada. Ele se inicia com algo inflamado da paisagem em que caminho: uma fisgada externa de uma imagem ou um vestígio da história de um movimento político contra-hegemônico no bairro, por exemplo. Eu incorporo a inflamação que vejo e a devolvo como escritura feminista.